Meu Amado Imprevisível
Se eu viver cem anos ainda será pouco para organizar e interpretar os pensamentos e conceitos sobre as mil - ou zero - razões que fazem nascer um amor. Posso ficar horas maquinando sobre porque A escolheu B , ou C preferiu ficar com D. O que é que funciona, o que encanta, o que atrai, o que atrita, o que separa, e o que, afinal, faz com A seja definitivo (enquanto dure) na vida de B, ao invés de qualquer uma das dezenas de outras alternativas que poderia escolher. Mesmo que o mar não esteja para peixe, e estas dezenas aí, na prática não passem de uns dois gatos pingados, sempre haveria a possibilidade de ser diferente se assim não fosse, sacou? Algum de nós poderia ter virado à esquerda ao invés de direita em qualquer momento do caminho, e feita esta escolha diferente, com certeza criaria o potencial e a probabilidade de mudar todos os desfechos e encontros seguintes, por anos a fio, ou por uma vida inteira.
Cada pessoa, obviamente, é muito única; um universo, como dizem os melhores chavões. Uma combinação específica, particular e altamente peculiar, de tendências, desejos, coragens, medos, modos, silêncios, fugas, risos, marcas, sonhos, cores, tudo. Ingredientes que repelem ou estimulam o contato, sem que a gente nem mesmo se dê conta, em muitas das vezes. Quando a ficha cai, pimba! A paixão já tomou conta - sorrateira, esta desclassificada - e não avisou ninguém, não pediu licença, não perguntou se a gente queria ou se estava podendo. E paixão, para virar amor - não que um substitua ou exclua o outro - você sabe, é só querer. E cuidar.
Em meio a todas possibilidades e equações, tantas vezes esdrúxulas , que o amor nos reserva (para não dizer nos apronta), sempre se pode encontrar, com cautelosa investigação, alguns ou um, que seja, denominador comum dentre aqueles que nos despertaram para esta viagem. E nesta hora se vê de tudo. Tudo mesmo. O que as pessoas procuram, ou não procuram, em alguém para dividir os sonhos, vai desde os óbvios predicados físicos e monetários, até os fetiches mais improváveis e inexplicáveis.
Neste ponto, creio que seja seguro dizer com base em nada além de meu achômetro, que boa parcela das mulheres - vou falar de quem desconheço um pouco menos - gosta de um homem que lhe transmita segurança. E falo de segurança emocional mesmo, deixando a grana de lado por hoje. E o que proporciona a tal segurança emocional, a meu modesto ver, é a confiabilidade emocional. E o que provoca a confiabilidade emocional é saber, ou ter uma boa ideia, de como ele irá se comportar. Em outras palavras, é um homem previsível.
Tenho grandes suspeitas de que meu denominador comum nesta questão, tenha sido um quase oposto disto. Quase, porque seria exagerado e equivocado dizer que imprevisibilidade, por si, me encanta. Pelo contrário, a imprevisibilidade pela imprevisibilidade apenas, me cansa. O que encanta, deslumbra, convida, toca, envolve, move, é o homem dono de si mesmo. E este não é espécime para desavisadas, nem cautelosas, nem moças que procuram um relacionamento meramente pela segurança que ele possa trazer.
O homem dono de si mesmo provavelmente vai te irritar. É quase certo que irá te decepcionar em dados momentos. É possível que ele te leve a questionar sua escolha e sentimento. A reação mais comum é que te brinde com reticências, interrogações e exclamações (não é tão dado a vírgulas e pontos finais). Este, é um tipo que vai de encontro ao que acredita, não sem antes - e durante - errar muito, e manifestar tantos defeitos quanto qualquer outro, ou até mais defeitos do que qualquer outro. Isto, é claro, considerando que ele esteja lidando com uma também dona de si mesma, mulher. Haverá divergências, haverá conflitos, haverá incompreensões. Tudo superável, na melhor das hipóteses, porque desencontros não implicam anexar ofensas, desrespeito e desamor.
Esta criatura é um tipo que se lança, se expõe, se coloca, se retira, diz, cala, cria, e assim, constrói sua metade do mundo a dois, porque mesmo com ela, não deixa de ter também o seu mundo particular, o qual traz cheio de uma bela efervescência íntima para abastecer a relação.
Não raro, ouço periodicamente alguma mulher elogiar seu homem porque ele faz tudo o que ela quer. E eu não tenho nada contra estar satisfeita num relacionamento, que fique claro. Mas não consigo evitar, quando ouço comentários assim, pensar que alguém está se anulando neste casal. Que tipo de homem sem personalidade é este que consegue fazer tudo conforme deseja sua ama? Será possível que eles nunca discordem em nada? Ou então que estejam permanentemente preparados para realizar as vontades de seu companheiro? Com amor, quase nada cansa, eu sei. Mas será que a individualidade sai pela mesma porta que entra a relação? Pode ser uma bobagem sem tamanho questionar isto, mas sempre fico à deriva com este tipo de comentário.
Outro campeão de preferência, e este eu tenho medo (mesmo), é o bonzinho. A parcela de mulheres que elogia seu amor porque ele é muito "bonzinho" não está no gibi. Argh! Tenha dó pessoa, que bonzinho é cachorrinho! Não confundir, veja bem, com o homem bom. Que é outro, totalmente outro. Talvez o bonzinho acabe sendo uma variação, mais do mesmo, daquele que faz tudo o que ela deseja e espera. Sem criticar o relacionamento de ninguém, não sei como estas pessoa sobrevivem. Talvez possuam um grau de abnegação que eu nem sonho e, possivelmente, não alcance tão cedo.
Mas, e é claro que aqui entra o mas, também não posso evitar imaginar, que mulher tão insegura de si é esta que não consegue lidar senão, com aquele que é e faz exatamente aquilo que está no script.
Não sendo sinônimo de egoísmo, autossuficiência, descuido, desmando ou desatenção, esta, por assim dizer, imprevisibilidade, que na verdade não é mais do que autenticidade, é o grande exercício ao qual todos nós deveríamos nos propor. E o resultado é uma aura absolutamente magnética, porque nada mais atraente do que alguém que veio ao mundo apenas, para ser ele mesmo. E sim, este querido autêntico, pode sim satisfazer a sua amada, mimar e fazer vontades; enquanto ela também estará lhe fazendo o mesmo, pois, sem dúvida, este é um dos grandes baratos e delícias de viver a dois. Mas dentro daquilo que ele é, e não do que o "manual de ética, moral e bons costumes do relacionamento" recita. Sem massificação do amor, só com trocas intensamente e inteiramente reais.
A inteligência num homem é a coisa mais linda, e esta inteligência, em seu sentido mais elaborado, profundo e completo, nunca deixará de abranger também a sensibilidade que o levará a fazer-se presente, desejável, notado e sentido. À sua maneira. Não como se prevê ou espera, mas como ele , e só ele no mundo, sabe fazer.
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